DESLIMITES

 

Já se sabe que falta grandeza ao normal

e também dizem que há pouco amor no geral.

Os que menos foram massificados

se perguntam por que esta grande planície

toma forma de lugar cinza e medíocre.

Surge a resposta tal verdade revelada

quando aquele de alma grudada no chão

ergue a vista e logra avistar seu céu.

Percebe ele que a luz disponível emana

de entes pensadores decolados da multidão

orientados e propelidos pelas forças da razão.

 

Voam os senhores e servos da lógica

sobre o convívio dos normais mortais.

E ao sobrevoar o consenso balizando a ética

esses inventores de nossos parâmetros

e empobrecedores dos enredos correntes

fazem de nosso campo um triste lugar comum.

 

Intelectuais porque pensam desfraldam

lá em cima as leis que cuidam da ordem.

Nada mais que simples leis ordinárias.

Ainda que superiores não dignificam ares

Nem lhes acrescentam valores divinos.

Suas idéias bem antes de subir e valer

no chão devoraram as nossas utopias.

Hoje vemos que os ideais castrados

após transmudados em normas vigentes

nos regem com a autoridade da dialética.

Respira-se o sistema como calmante oxigênio

vertido grátis de respeitáveis alturas

lá nos cumes eternos que escondem os horizontes

dos vales habitados por homens conformados.

 

Os que sobem do povo não são deuses

Por raciocinar e deter o poder.

Sem se tornarem maiores e mais felizes

seguem semelhantes que apenas praticam

a velha e natural arte do humano saber.

De uma forma que é sua e parece especial

acabam integrados à paisagem normal.

 

Mas a planície é fragmento vivo

expelido na explosão da galáxia.

Tem precário equilíbrio instável

movediço piso do nada definitivo.

Assim quando ocorrem por acaso

determinadas conjunções astrais

eventos cruzados recriam as condições

para sobrevir certo momento único.

 

Nesse instante inesperado e importante

com razões carentes de explicações

o objeto conhecido que voa normal

desliga o motor e torna-se planador.

Não se pergunte da transformação

silhuetado fenômeno de superação.

Assista-se nascer uma cabeça liberta

que disse adeus à equação correta

passando a usar só as asas do amor.

Os sonhos que antes filhos da lógica

se realizam totais no vôo do pássaro

ledo egresso das gaiolas sensatas.

 

Com grandes asas como condores

planam os artistas e livres-pensadores

desenham um vago universo de poesia

sobre as vulgares humanas limitações.

Olham os muitos prisioneiros da planície

os exemplos de ser dos que alargam limites.

Há um certo fascínio beirando a inveja

e dele a dúvida que toca a certeza

sugerindo a vida com outras fronteiras.

Há uma luz agradável e uma verdade provocante

um inequívoco cintilar desconcertante

tudo estímulo para um novo aceitar.

Não será tão outro este mundo?

Assim ponderam os normais gerais

seguros pelos muros tradicionais

erguidos e guardados pelos intelectuais.


Mas porque o cinza também existe

para ser fundo do arco-íris inteiro

perspectivas maiores têm os pequenos

ao ver os grandes sobre si crescerem.

Então os homens comuns acenam aos poetas

e se alegram com as revoluções loucas

desses seus belos e insólitos cometas

que têm na cauda faixas de propaganda

com mensagens que abrem e colorem mentes.

 

Doces subversivos agentes voadores

que altos nos tornam pequenos

na consciência do chão

e luminosos nos erguem os olhos

a perceber os incríveis

mágicos e formidáveis

deslimites da razão.